Um palco histórico, mas com entraves
Em novembro de 2025, Belém, a capital do Pará, será o epicentro das discussões climáticas globais ao sediar a COP30, a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Pela primeira vez, a Amazônia será o cenário dessa cúpula, uma escolha simbólica para destacar a importância da maior floresta tropical do mundo na luta contra o aquecimento global. A expectativa é receber cerca de 50 mil pessoas, incluindo chefes de Estado, diplomatas, cientistas e representantes da sociedade civil. Mas um problema ameaça o sucesso do evento: os preços exorbitantes das hospedagens.
Diárias de hotéis e imóveis em Belém dispararam, com cotações chegando a US$ 700 (quase R$ 4 mil) por pessoa por noite, segundo diplomatas citados pela Reuters. Em alguns casos, apartamentos para o período do evento, de 10 a 21 de novembro, são oferecidos por até R$ 2 milhões por 11 dias! Esses valores, considerados “abusivos” pelo presidente da COP30, André Corrêa do Lago, estão afastando delegações, especialmente de países em desenvolvimento, que não conseguem arcar com custos tão altos. A pergunta que paira é: como garantir que todos, incluindo as nações mais pobres, participem dessa conferência crucial?

Por que os preços estão tão altos?
O aumento vertiginoso das diárias reflete a escassez de infraestrutura hoteleira em Belém. A cidade, com 1,3 milhão de habitantes, dispõe de cerca de 18 mil leitos formais, número insuficiente para acomodar os 45 a 50 mil visitantes esperados. A Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Pará (ABIH-PA) aponta que os 4.122 quartos disponíveis na capital já estão praticamente esgotados. Esse déficit, combinado com a alta demanda, gerou uma onda de especulação imobiliária, com hotéis cobrando até 10 vezes mais que o normal, contra o aumento usual de duas a três vezes em outras edições da COP.
A situação gerou revolta internacional. Países como Polônia e Holanda já sinalizaram que podem reduzir suas delegações devido aos custos, enquanto nações africanas e pequenos Estados insulares alertam que os preços inviabilizam sua participação. Richard Muyungi, presidente do Grupo Africano de Negociadores, destacou: “Não estamos dispostos a reduzir nossas delegações. O Brasil precisa oferecer respostas melhores.” A ONU, preocupada com a exclusão de países mais pobres, convocou uma reunião de emergência em 29 de julho para pressionar o Brasil a resolver o problema, com um relatório prometido para 11 de agosto.
Soluções criativas para uma COP inclusiva
Diante da crise, o governo brasileiro, em parceria com o estado do Pará e a ONU, está implementando medidas para ampliar a oferta de hospedagens e conter os preços abusivos. Aqui estão as principais estratégias:
Navios de cruzeiro como hotéis flutuantes
Uma das soluções mais inovadoras é o uso de dois navios de cruzeiro, que serão atracados no Porto de Outeiro, a 20 km do centro de Belém. Esses “hotéis flutuantes” oferecerão cerca de 6 mil leitos, com diárias de até US$ 220, destinadas prioritariamente a 98 países em desenvolvimento e pequenos Estados insulares. A iniciativa, mediada pela ONU, visa garantir acomodações acessíveis para delegações com orçamentos limitados.
Adaptação de escolas e prédios públicos
O governo do Pará está transformando 17 escolas estaduais em hostels temporários, com capacidade para 5 mil pessoas. Um exemplo é a Escola Estadual Ulysses Guimarães, que recebeu R$ 9 milhões para reformas. Além disso, um prédio da Receita Federal na Rua Gaspar Viana será convertido em um hotel cinco estrelas com 255 apartamentos. Vilas militares e espaços religiosos também estão sendo adaptados para receber visitantes.
Plataforma oficial de hospedagem
Desde maio de 2025, o governo federal contratou a empresa Bnetwork para gerenciar uma plataforma digital que centraliza reservas de hotéis, imóveis de temporada e navios. A plataforma, lançada em etapas, oferece 2.500 quartos com tarifas fixadas entre US$ 100 e US$ 600, incluindo 15 quartos por delegação para 73 países menos desenvolvidos, com diárias de US$ 100 a US$ 200. Essa iniciativa busca maior transparência e controle sobre os preços.
Parcerias com plataformas de aluguel
Negociações com Airbnb e Booking estão em andamento para cadastrar imóveis particulares, ampliando a oferta para cerca de 11,5 mil leitos. Um acordo firmado em novembro de 2024 com essas plataformas já aumentou a disponibilidade de acomodações em 54%, segundo o Airbnb. Workshops estão sendo realizados para capacitar proprietários a oferecerem suas casas a preços justos.
Novos hotéis e infraestrutura
Três hotéis de alto padrão, construídos por grupos internacionais, estão em obras, adicionando mais de mil leitos. O grupo português Vila Galé, por exemplo, está reformando galpões no Porto Futuro II para criar um novo hotel. Além disso, o Porto de Outeiro está sendo ampliado, e uma nova ponte conectará o porto ao local da conferência em cerca de 30 minutos, facilitando a logística.

O que está em jogo?
A COP30 não é apenas uma conferência; é uma oportunidade para o Brasil reafirmar sua liderança na agenda climática global. Com metas ambiciosas, como reduzir emissões de carbono entre 59% e 67% até 2035, o país quer mostrar ao mundo o valor da Amazônia na absorção de carbono e na preservação da biodiversidade. No entanto, o sucesso do evento depende de sua acessibilidade. A exclusão de países em desenvolvimento devido aos custos de hospedagem comprometeria a legitimidade da conferência, como alertou André Corrêa do Lago: “Queremos uma COP inclusiva, com todos os países membros.”
Além disso, a crise hoteleira expõe um dilema maior: como conciliar o impacto de um evento global com a sustentabilidade que ele prega? A construção de uma rodovia de quatro faixas, a Avenida Liberdade, para facilitar o acesso a Belém, já enfrenta críticas de ambientalistas por desmatar áreas protegidas da Amazônia. Será que a COP30 conseguirá equilibrar suas promessas climáticas com os impactos de sua própria realização?
O papel do Brasil na pressão internacional
A pressão internacional é um alerta para o Brasil. Vinte e nove delegações, incluindo países desenvolvidos como Bélgica, Canadá e Noruega, assinaram uma carta sugerindo a transferência da COP30 se os problemas de hospedagem não forem resolvidos. A ONU estipula um teto de US$ 164 por diária para subsídios, mas os preços atuais em Belém estão muito acima disso. O governo brasileiro, liderado pelo presidente Lula e pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, insiste que não há “plano B” e que Belém será a sede. “O presidente Lula escolheu Belém para mostrar a realidade de uma cidade amazônica ao mundo”, afirmou o ministro das Cidades, Jader Filho.
Para conter os preços, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) notificou 24 hotéis para explicar os aumentos, e um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi firmado com parte do setor hoteleiro, reservando 20% dos quartos a preços de até R$ 500. No entanto, a falta de adesão de alguns estabelecimentos e a ausência de limites legais para tarifas continuam sendo desafios.
Uma COP histórica ou uma oportunidade perdida?
A COP30 em Belém tem o potencial de ser um marco na luta contra as mudanças climáticas, mas seu sucesso depende de superar os gargalos estruturais. As soluções propostas, como navios de cruzeiro, escolas adaptadas e uma plataforma de hospedagem, mostram um esforço para tornar o evento inclusivo. No entanto, a especulação imobiliária e a pressão internacional exigem respostas rápidas e eficazes. A menos de 100 dias do evento, o Brasil precisa provar que pode sediar uma conferência global sem excluir os países mais vulneráveis às mudanças climáticas.
O que você acha? Será que Belém conseguirá superar esses desafios e fazer história com a COP30? Deixe sua opinião nos comentários e acompanhe as atualizações sobre a conferência climática mais aguardada do ano!
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